terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A Arma Escarlate: O Harry Potter do Dona Marta

Quando a literatura brasileira é tão boa quanto um best seller



"No Brasil nada se guarda, nada se arquiva, tudo se esquece."


A Arma Escarlate é aquele tipo de livro que antes de lê-lo você precisa deixar todo e qualquer pretexto para comparações com outras "obras similares" de lado, seja elas por qual a autora bebeu da fonte como inspiração ou citações indiretas presente na obra. Feito isso aproveite as 488 páginas de pura leitura.

Sinopse: "O ano é 1997. Em meio a um imenso tiroteio, durante uma das épocas mais sangrentas da favela Santa Marta, no Rio de Janeiro, um menino descobre que é bruxo.
Jurado de morte pelos chefes do tráfico, Hugo foge com apenas um objetivo em mente: aprender magia o suficiente para voltar e enfrentar o bandido que ameaça sua família. Nesse processo de aprendizado, no entanto, ele pode acabar por descobrir o quanto de bandido há dentro dele mesmo."

Renata Ventura - 488 páginas - Novo Século 

Com uma narrativa arrebatadora, Renata Ventura mostra que é possível sim criar boas histórias utilizando-se de elementos do mundo bruxo mesclando-os com nosso cotidiano dando um jeitinho brasileiro na coisa toda.

Esse jeitinho brasileiro, aliás, dá nessa obra características únicas à seres bem conhecidos da cultura brasileira, como o folclore e o contexto da colonização de Portugal, reescrita aqui de maneira descontraída e mágica. Já imaginou Maria, a Louca como bruxa? Não? Renata Ventura sim. Se você perdeu/faltou/não prestou atenção a aula de história, leia e saiba quem é Maria, a Louca em Wikipédia.

A comparação com Harry Potter é justamente por que a autora bebeu direto da fonte, simples assim. Sentindo-se autorizada por uma declaração que J.K.Rowling deu como resposta à pergunta de um fã norte-americano, Renata Ventura pensou seriamente em como seria uma escola bruxa no Rio de Janeiro, idealizando-o no livro, com termos que nós leitores já estamos familiarizados, ora reescrevendo nossa história ora nos surpreendendo com suas bizarrices sem tirar toda a graça que o Brasil, mais especificamente o Rio da Janeiro possui.

Até os sotaques foram preservados nos diálogos das personagens, visto que cada local tem-se uma forma diferente e polida utilizada por cada cidadão, o que pode vir a ser estranho se você está acostumado com aquela tradução padrão utilizada pelas editoras no geral.

O mais interessante e instigante na obra é o fato dela não esquecer a realidade contextual do espaço-tempo em que a história acontece. Que além de tudo mágico que existe por aí, a realidade de quem vive cercado pelo tráfico e as constantes ameaças também estão presentes, bem como os medos e as inseguranças.

Por mais que haja a comparação com Harry Potter, aqui o protagonista Hugo é completamente o oposto, com diversos traumas e crises existenciais que vive colocando em cheque seu relacionamento com os outros durante o andamento da obra. Inclusive, sua criação acaba facilitando tudo. Pobre e morador da favela, Hugo vê no tráfico o modo de sair da miséria e vê nele sua maldição e perdição.

Há diversos momentos da leitura que somos contra as decisões tomadas por Hugo, como por exemplo, vender drogas na escola afim de salvar a vida de sua mãe. Isso acaba transformando o protagonista no vilão da história, utilizando-se do argumento de estar sendo "controlado" por terceiros, nesse caso os chefes do tráfico, tendo plena consciência de estar fazendo a coisa errada e ainda gostar um pouco do que está fazendo.

Sem mais delongas, Renata Ventura recriou um mundo sem deixar que as críticas sociais ficassem de fora, que querendo ou não ainda estão presente na sociedade atual brasileira, como as drogas, o preconceito, a desigualdade social, o abandono e a corrupção.

A Arma Escarlate é lançado pela Editora Novo Século e está atualmente em sua segunda edição, tendo a primeira se esgotado na Bienal do Livro de São Paulo de 2012. Sua capa é simples e ao mesmo tempo que é sugestiva.

Não lembro de ter encontrado nenhum erro significativo e que me fizesse interromper a leitura. Só me senti incomodada justamente pelos diálogos serem marcados por aspas (" ") e não pelo tradicional travessão. Sua diagramação pode incomodar a uma primeira vista, pois o tamanho da fonte é um pouco menor do que o usual em livros. Contudo, não é nada que venha atrapalhar a leitura.

Atualmente, a autora está escrevendo a continuação do livro que deve sair ainda no primeiro semestre deste ano, com o título provisório de A Comissão Chapeleira.

*imagem da capa do grupo #A Arma Escarlate Brasil

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Um comentário:

  1. Primeiro, adorei você ter escrito uma dica em letras pequenas, realmente muita gente pode precisar dela, afinal muita gente não ta nem aqui para a aula de história, eu sei, sou professora de História.

    No mais, você colocou lindamente esse livro na minha lista de futuras leituras, fiquei aqui intrigada e doida para conhecer a proposta. Gosto de literatura brasileira, especialmente quando os autores ousam usar sua pena para falar de nossa realidade, dialogar com nossa história e usar a imaginação para ir além do obvio.

    Cheros, Jaci (Pandora).

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